Nosso sócio Filipe Arantes contribuiu com artigo da Capital Aberto sobre o PL 145/22, projeto que aborda a tributação de Trusts no Brasil.
– Quais são os principais pontos do PLP 145/22? Ele representa um avanço em relação ao PL 4.758/20, aprovado na Câmara?
Filipe Arantes: O PLP 145/22 representa um grande avanço na abordagem do trust, posto ser um projeto pioneiro na busca do reconhecimento de seus efeitos no Brasil, principalmente ao tratar do estabelecimento de normas relacionadas ao tratamento tributário a ser dispensado ao trust no Brasil. O projeto basicamente define os termos relacionados à figura do trust; trata da lei e foro aplicáveis ao trust formado no exterior e dos efeitos que produzirá no Brasil, principalmente em aspectos relacionados ao direito sucessório; e apresenta o tratamento tributário a ser dispensado ao trust no Brasil.
O PLP 145/22 representa um avanço em relação ao PL 4.758/20. Enquanto este último dispõe sobre a fidúcia e busca trazer ao ordenamento jurídico brasileiro o instituto do trust – por meio da utilização do modelo de fidúcia como mecanismo semelhante ao trust, e que atingiria os mesmos objetivos do ponto de vista patrimonial –, o PLP 145/22 busca reconhecer e disciplinar os efeitos produzidos no Brasil por trusts formados no exterior, abordando de forma muito mais detalhada aspectos patrimoniais e tributários do trust, com a apresentação de respostas às diversas dúvidas sobre o tratamento tributário a ser dado ao trust no Brasil.
– De acordo com o PL 145/22, haveria alguma tributação (ITCMD ou ITBI) no momento em que ocorre a transferência do patrimônio do instituidor para o trust? Quando ocorreria a tributação do ITCMD e do ITBI?
Filipe Arantes: Não. De acordo com o projeto, não haveria a incidência de ITCMD ou ITBI no momento da transferência do patrimônio do instituidor para o trust.
A tributação do ITCMD ocorrerá quando o beneficiário do trust adquirir de forma incondicional, total ou parcialmente, direito sobre o patrimônio do trust, ou seja, a partir do momento em que possuir o direito imediato, não sujeito a termo ou condição, de acessar qualquer parcela de ativos do trust, momento em que a legislação o define como “beneficiário efetivo”.
Em relação ao ITBI, a sua incidência ocorreria em duas hipóteses. Na primeira, quando os bens imóveis ou direitos reais sobre imóveis ou direitos à sua aquisição tiverem sido adquiridos com resultados auferidos pelo trust após a aquisição do beneficiário efetivo de tal condição (ou seja, o trust adquiriu o imóvel com base nos resultados do próprio trust). Na segunda, quando o instituidor, que também pode ser beneficiário, receber o imóvel do trust – nessa hipótese, o imóvel não pertencia ao instituidor quando o trust foi constituído. Nesse ponto, vale explicar que, em alguns casos, o próprio instituidor pode ser beneficiário do trust.
– Em que ocasiões o beneficiário seria tributado pelo imposto de renda (IR)?
Filipe Arantes: O beneficiário seria tributado pelo imposto de renda (IR) nas situações em que forem transferidos do trustee para o referido beneficiário bens e direitos localizados no Brasil por valor de mercado, maior do que o valor do mesmo bem no momento da constituição do trust, ou seja, deverá ser apurado ganho de capital se o valor de mercado de um bem superar o custo de aquisição dos bens ou direitos transferidos.
– Há pontos que ainda precisam ser aprimorados no PLP 145/22? Qual é a expectativa com relação à sua discussão e tramitação?
Filipe Arantes: Sim, alguns pontos precisam ser aprimorados, como por exemplo nas questões relacionadas à figura do trustee, tendo em vista que não foram abordados os impactos tributários e obrigações do trustee que seja residente fiscal do Brasil ou tenha seu controlador no Brasil. Além disso, seria importante aprofundar algumas questões sucessórias como a da colação apresentada no parágrafo único, do artigo 6º do PL 145/22, em que o legislador mistura o instituto da doação com o instituto do trust, ao afirmar que os herdeiros deverão trazer à colação os bens e direitos que “tenham efetivamente recebido em doação do instituidor antes do seu falecimento por intermédio do trustee”, sem esclarecer se haveria alguma hipótese de dispensa de se trazer os bens à colação como na hipótese de se tratarem de bens disponíveis do instituidor do trust e na hipótese deste ter dispensado os herdeiros de trazer referidos bens à colação.
Mas vale destacar que, apesar dos aprimoramentos necessários, a proposta legislativa é muito bem elaborada e pertinente. Infelizmente, a tramitação desses projetos geralmente é lenta, mas espera-se que o legislador dê especial atenção a esse projeto, dada sua importância e diversas dúvidas que têm surgido sobre o tema.