No julgamento do Conflito de Competência nº 196.553, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a competência para decidir sobre a constrição de dinheiro de empresa em recuperação judicial é o do juízo onde se processa a execução fiscal, com fundamento no art. 6º, §7-B da Lei 11.101/05, uma vez que dinheiro não configura bem de capital.
A leitura da notícia, ou sua “ementa”, isoladamente, pode levar o leitor a entender que não exista nenhum equívoco na decisão, porém, a análise do caso revela outros problemas.
Primeiro: A execução fiscal, na verdade, não foi proposta para cobrança de um tributo, crédito esse que efetivamente não faz parte do concurso de credores (cf. art. 187 do CTN), mas sim para cobrança de multa administrativa pelo DNIT, que não é tributo, e deveria estar sujeita aos efeitos da recuperação judicial (a definição de tributo é clara e exclui sanção por ato ilícito, cf. art. 3º do CTN);
Segundo: Os tribunais decidiram se limitar a análise do termo “bens de capital” partindo de uma visão da indústria Brasileira (e mundial) da década de 70/80, em que a operação demandava a utilização de máquinas e equipamentos, e esses “bens”, eram detidos pela empresa e essenciais para sua atividade. A bem da verdade, a realidade atual, com suas exceções, é outra, pois as empresas cada vez mais se utilizam da locação de equipamentos, que possui diversos benefícios, inclusive fiscais, e, esses “bens de capital”, são usualmente detidos por outras empresas que tem a locação como fonte de renda. Fechar os olhos para essa realidade é aplicar o direito sem a devida aplicação prática. O bem essencial da empresa hoje é o capital e grande parte das crises vividas pelas empresas decorre do custo do capital ou da sua gestão no tempo.
Terceiro: Ao permitir a continuidade da execução fiscal, autorizando o Estado a penhorar dinheiro de uma empresa em recuperação judicial, sem que o juízo da recuperação judicial possa decidir ou não sobre essa constrição, eventualmente estaremos em uma situação em que esse dinheiro implique em prejuízo para as operações, e o pagamento do plano de recuperação judicial, que, tem como consequência a falência. E diante desse quadro, todos saem perdendo. De fato, a situação gerou um privilégio para o Estado ao sacrifício de todos os credores e até do próprio Estado, que poderá não ser pago na falência.
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